terça-feira, 25 de setembro de 2012

A Tirania da Auto Imagem do Eneatipo Dois Conservacional - Sergio Condé

 

A Tirania da Auto Imagem do Eneatipo Dois Conservacional -

 A grandeza do Espírito (essência divina) vem de sua criação divina, pois o Criador compartilha a Sua Grandeza com Suas criaturas. Ao ego só lhe resta cobrir sua pobreza de espírito com uma ilusória grandiosidade feita de autoimagem e autoimportância, buscando destacar-se, num pretensioso valor autoatribuído, ora ganhando ora perdendo, num jogo de cartas marcadas cujas regras são: valores irreais, comparações e julgamentos.

A tirania da autoimagem não permite àqueles que procuram se vestir de glórias, cometerem erros, nem falhas, nem sequer permite o saudável reconhecimento dos próprios erros, portanto, esta veste incômoda, pesada e orgulhosa, interfere com o processo do arrependimento (metanóia) que facilita a transformação.

A tirania da autoimagem impede a evolução daquele que a valoriza, pois ele fica girando em pensamentos autoavaliativos circulares em volta de seu próprio umbigo e incerto quanto suas próprias conclusões e as conclusões do mundo. A tirania da autoimagem não permite ao seu usuário fazer um humilde aprendizado a partir de seus próprios acertos e erros. Neste campo da experiência humana, a pessoa que investe em parecer grandiosa e especial, para si mesma e para outros, tem três alternativas: Ou ela acerta e fica bem ou então, erra, mas, logo em seguida, atribui a responsabilidade por seus erros aos outros, livrando-se assim da culpa ou então, na terceira opção, ela erra e é-lhe inevitável ver que errou. Neste caso ela se isola, como uma incompreendida e envergonhada vítima do mundo, que a acusa por seus erros.

O seu isolamento é conseguido à custa de uma crença na superioridade da autosuficiência. Mas é, na verdade, uma fuga do mundo, porque o mundo para ela é insuportável, sendo o palco em que erros acontecem entre as partes. É justamente lá, no mundo, que sua autoimagem toda pura e inflada é colocada à prova e corre o perigo de ser ferida, melindrada e enlameada.

Em sua torre de marfim estará protegida de si mesma, protegida de ser reconhecida por si mesma como insuficiente, confusa, infantil e inexperiente e, desde o alto de sua torre, evita agir ou escolher aquilo que quer ser ou o que quer fazer com sua vida, pois assim evita também sentir-se tiranizada por sua auto exigência em realizar algo sem cometer erros e o pior, evita de ter outros como testemunha de sua temida incompetência em ser admirável. Pois, sua gloria desejada é ser a prova viva de um ideal de superioridade: Generosidade, Pureza, Perfeição, Impecabilidade no agir perfeito, garantias seguras de aplausos e elogios dignos de um príncipe ou de uma princesa*. (*as palavras príncipe e princesa, etimologicamente, vem de ”princípio” ou seja: regidos por princípios régios)

Porém o calcanhar de Aquiles do Dois Conservacional é sua atração romântica pelo relacionamento a dois. Neste palco ele será atraído para fora de sua torre de marfim, pois aí ele pode finalmente brilhar sedutor e sentir que o amor apaixonado do outro aos seus pés será o reconhecimento esperado por sua grandiosidade, até então tão mal compreendida pelo mundo cruel.

Descendo de sua torre de marfim Esse eneatipo volta à sua sedução teatral, Quando se vê correspondida, consegue aplacar a solidão que, na sua auto suficiência amargou. A carência curtida na solidão é seu “top secret” nunca revelado, nem mesmo para si mesmo. Mas, uma vez iniciada uma relação, o encanto de um conto de fadas irá se desfazendo à medida da incapacidade de seu enamorado cumprir com suas exigências de perfeição, pois o Dois Conservacional exige um consorte que seja feito à imagem e semelhança do seu narcisismo pois, “Narciso acha feio o que não é espelho” e ele só poderá amar se o outro conseguir subir à sua altura, ou seja, à altura de seus ideais torturantes.

O Conto de Fadas também pode acabar pior do que isto: Seu par pode vir a ser a testemunha bem humorada de suas ridículas pretensões de superioridade ou recuar em sua paciência e boa vontade fazendo críticas bem fundamentas a respeito dos ataques de mau humor do Dois Conservacional diante das frustrações inevitáveis nos relacionamentos.

O castelo de cartas do conto de fadas desabará inevitavelmente e isso poderá ser ou não desastroso para o Dois: Na maioria das vezes isso será um término banal, caso seu narcisismo o proteja rapidamente de entrar em contato com sua solidão oculta, desativando rapidamente seu potencial de carências e desconectando as dores esquecidas da infância. Seu narcisismo será seu principal escudo, desde quando continue sendo uma defesa eficaz. E funcionará, negando e projetando a sua imensa carência no parceiro abandonado, vendo-o como um sapo pegajoso, que é incapaz de amar, sendo não merecedor de seu amor tão puro e especial ou então, constatando a evidência de que o outro é um bruto insensível e impuro que nunca poderia vir a reconhecer a sua especialidade em matéria de amar com sensibilidade e que, ainda por cima, deseja ardentemente vir para cima dele com suas mão sujas de desejos mundanos e sujar suas alvas vestes majestosas de princesa ou príncipe. Como isso é inaceitável, é também inevitável dar à seu apaixonado patético um adeus sem volta, resolver toda a complicação criada com um corte final, a solução mais fácil diante de sua incompetência de ir até o fim sempre que uma dificuldade qualquer o frustre. O corte na relação, desde que seja decretado pelo Dois Conservacional, será sempre seguido de um alegre e irresponsável alivio na recuperação da sua velha e conhecida liberdade. O dois não sente culpa em terminar sua relação, mas sente pena diante das lágrimas e súplicas daquele que caiu nos seus encantos, mas que cometeu o erro de perder a compostura, mostrando-se vergonhosamente carente.

Porem, o término poderá ser um desastre, caso o narcisismo do Dois o traia e se mostre insuficiente na hora mais decisiva, quando inesperadamente, outro - cansado de ocupar o lugar do sapo paciente à espera de beijos, os maravilhosos e raros beijos sedutores e os dificilmente conquistados, e que são dados com uma cara de nojo - se enche de coragem e autoestima e se auto proclama rei, decretando o término da relação e condenando a princesa ou o príncipe orgulhoso ao exílio, puxando-lhe o tapete de rosas e assistindo, com um doce sorriso nos lábios, a queda daquele nariz imperioso no vil chão dos rejeitados, de onde o sapo que se fez rei se ergueu, logo antes de ser descartado e é só assim que um sapo rei consegue sair vitorioso na missão impossível que é se relacionar com um Dois Conservacional a longo prazo.

A paixão sofrida e enlouquecedora só será vivida pelo Dois Conservacional quando, num relacionamento, finalmente acontece-lhe a quebra seu narcisismo que, sucumbe à paixão e regride de volta à sua velha ferida, a mesma que deu origem à seu sistema defensivo. Quando o punhal da Humilhação volta sangrar o coração da infância, o Dois Conservacional se vê de volta à sua velha dor, aquela que buscou seu refugio no orgulho.

Em suas dores e raivas, por seu orgulho ferido, o velho conflito da autoimagem reinará ainda mais cruel. De um lado, a pressão por ser quem não se é: por exemplo, no sucesso eventual de não se permitir demonstrar que o outro é desejado, proeza esta conseguida com muito esforço, do outro lado alguns inevitáveis fracassos quando, por fraqueza sua carência é inocentemente exposta, seguido por uma súbita rebeldia emocional, que pode jogar tudo no chão e querer desistir de viver neste mundo de infelicidades insuportáveis.

Pois foi num desses momentos terríveis, lá longe em seu passado, que então O Dois Conservacional criou uma fé às avessas, uma crença inabalável na crueldade do mundo e de que o próprio Deus é cruel, por ter criado um mundo assim.

Depois de seu caráter ter se cristalizado, com a ajuda desta crença religiosa infantil, lhe será possível, muitas vezes, continuar abdicando da responsabilidade por sua infelicidade e continuar projetando a culpa lá fora, como se o mal viesse do mundo, viesse de Deus.

Mas, numa terapia é possível conseguir ver que é dentro de si que resiste o terrível conflito da autoimagem, que não lhe permite ser simples e feliz assim como ele é agora. No seu conflito há dois personagens: Um é um Top dog tirânico, que insiste para que ele seja mais do que aquilo que ele dá conta, insiste para ele ser aquele que está sempre certo sendo o melhor e, do outro lado um Under Dog dramático e explosivo que, no seu exagero emocional e sob pressão, desabafa rebela e grita, para logo depois pedir desculpas, mas sem sentir culpa realmente.

Por trás desses dois personagens, um criança guarda seu sentimento de insuficiência que nunca mais pode ser expresso, uma verdade íntima, ora oculta ora desconectada, uma voz silenciada de alguém que fica por traz das imagens ideais e das fantasias irreais, algo autêntico que vive no coração esperando por ser adivinhado, pois, não pode pedir ajuda, nem pode errar, nem mostrar suas necessidades mais profundas. Caso essa verdade venha à tona num deslize, será coberta de vergonha e medo da humilhação.

O céu na terra para aquele que sofre este tipo conflito é a humildade. Humildade implica em não comparar, em ser igual, em ser simplesmente humano. Na humildade não há conflito. Há aceitação da condição de ser pequeno e necessitado, como todo mundo. Na humildade torna-se fácil aceitar que não se sabe nada e nem se é nada. Fica fácil aprender com os próprios erros e acertos.

E é justamente neste nada, onde não há preocupação consigo mesmo e nem pretensões, que está sujeito a acontecer um vazio, uma desocupação de si mesmo. E, quem sabe, será justamente neste vazio desocupado que a grandeza do Espírito se sinta bem vinda para vir e brilhar em sua paz.
 

Sergio Condé