sexta-feira, 23 de maio de 2014

Prem Baba

O antídoto para os pactos de vingança é a renúncia. A questão é que a renúncia é fruto da compreensão. Até um determinado estágio você pode usar a espada da vontade consciente e fazer um voto, uma austeridade inteligente. Isso somente é possível quando você já pode compreender. A austeridade inteligente é uma maneira para descondicionar a mente. É um instrumento que serve para isso. É uma forma de ir além do vício. Mas, se você não compreendeu suficientemente, em algum momento você vai se frustrar, porque vai perceber a insuficiência da sua vontade. Você faz um voto e trai o voto às vezes no mesmo dia. Assim você começa a se frustrar e cair na armadilha do ceticismo, o que te faz não acreditar mais na sua capacidade de sair desse ciclo vicioso. Mas, estando consciente de tudo isso, você pode usar esse instrumento da austeridade inteligente para dizer “esse não sou eu”, “eu não dou mais alimento para esse eu viciado dentro de mim”. Até que, em algum momento, a renúncia floresça naturalmente dentro de você. Em algum momento o espírito da renúncia te pega. Aí, muito naturalmente, sem esforço, você deixa de se vingar. Você simplesmente compreende a estupidez e a falta de sentido dessa vingança. Você compreende que é somente um aspecto da ignorância. É somente um eu viciado em vingança que está ocupando o trono onde deveria estar o seu Eu verdadeiro. O impostor está ocupando o trono do rei. Então, em algum momento, você expulsa o impostor e senta no trono.
O impostor é viciado em tragédia; é viciado em dramas. O drama faz que com que ele sinta-se vivo. Pacto de vingança é outro nome para esse eu sofredor que é uma entidade, um complexo autônomo. O eu sofredor vive de sofrimento. Ele precisa gerar situações que tragam alimento para ele. Mas, esse eu sofredor que é o próprio pacto de vingança em si mesmo, já é um sintoma da dor. A dor é a raiz. Dá dor nasce o pacto de vingança que se desdobra nas matrizes do eu inferior, que é a destrutividade, e do eu inferior nascem as máscaras que são distorções dos atributos divinos. A distorção do amor, o vitimismo; a distorção do poder, que é a agressividade e a violência; a distorção da serenidade que é o retraimento, ou o anestesiamento. É isso que gera toda a miséria do mundo. A miséria continua se repetindo e multiplicando porque você tem prazer nisso. Em algum momento o prazer ficou conectado com o sofrimento. Com isso, você acha que, se abrir mão do sofrimento, abrirá mão também do prazer. Essa é a crença básica que habita o universo sombrio da personalidade. Você acredita que, se abrir mão do sofrimento, abrirá mão da vida. Isso é somente uma crença. Você pode ter prazer também no positivo. É possível ter prazer também no amor, na união... O pacto de vingança é esse casamento entre o sofrimento e o prazer. É o que faz você se punir para poder sentir prazer. Outro nome que eu dou para isso é ciclo vicioso do sadomasoquismo. Mas, como eu estava dizendo, são desdobramentos da dor original.
Então, a questão é chegar a esse núcleo para poder tratar dela. Você me pergunta qual prática pode ser antídoto para a dor. O antídoto é a compreensão. Quando chega ao núcleo da dor, você é iluminado pela sagrada compreensão, que naturalmente te explica porque você teve que passar por determinadas amarguras.
Eu estou dizendo que a crença básica vem do casamento da dor com o sofrimento, mas estou vendo que existe ainda outro ponto abaixo desse, que é a crença de que você é uma vítima. Então, quando você chega ao núcleo da dor e a sua compreensão é iluminada, você descobre que não é uma vítima. Por alguma razão você precisou estar nesse lugar.
Algumas coisas são difíceis para a mente compreender. Como a mente compreende o abuso sexual de uma criança? Como a mente compreende um pai querendo matar um filho? Como a mente compreende uma mãe que não quer saber do filho e quer jogá-lo pela janela? É difícil para a mente compreender que aquela criança também não é uma vítima. A personalidade é vítima de um sistema doente (e nós temos que cuidar desse sistema para evitar que horrores dessa natureza continuem se repetindo), mas no nível da alma, existe uma razão para isso ter acontecido. O que você precisa para se libertar da dor é compreender no nível da alma.
No mais profundo, a sua pergunta é “quem sou eu?” Quem é você enquanto uma alma em evolução, que passa por altos e baixos, por erros e acertos... Até que esteja você suficientemente maduro para poder receber sua verdadeira identidade. Até que esteja pronto para se unir ao Espírito Santo. A alma é a noiva que se casa com o espírito. Esse é o casamento alquímico do masculino e do feminino dentro de você. Esse é o encontro de Shiva e Shakti dentro de você. É somente quando ocorre esse casamento que você se torna o senhor de si mesmo. É só quando o masculino e o feminino se encontram dentro de você, que você se torna senhor de si mesmo.


Prem Baba