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segunda-feira, 13 de setembro de 2010
A tutela coletiva e Processo do Trabalho
A tutela coletiva
Com base neste polêmico assunto, farei uma breve exposição “histórica”, dos quais os doutrinadores mencionam uma série de fatores para o surgimento da tutela coletiva e a legitimidade do MP, dentre os quais destacamos quatro: urbanização das sociedades; massificações dos conflitos; aumento do número de demandas e, na esfera trabalhista, a falta de proteção contra a dispensa arbitrária.
Embora o acesso à jurisdição constitua direito fundamental de suma importância, consagrado no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988, infelizmente, no Brasil, ele não é implementado de forma plena, por diversos fatores, incluindo a deficiência do aparelho estatal.
No Brasil, em 1985, o legislador brasileiro, influenciado por processualistas de primeira linha1, que o sensibilizaram acerca da necessidade de se dar tratamento normativos aos chamados direitos difusos, editou a Lei n.º 7.347, também conhecida por Lei da Ação Civil Pública.
No âmbito legislativo, antes mesmo da edição da Lei n.º 7.347/85 que regula a ação civil pública, representando, sem dúvidas, um marco em se tratando de tutela coletiva, já havia outros diplomas normativos prevendo a tutela de interesse de classe. São eles:
a) antigo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – Lei n.º 4.215/62 que outorgava à OAB o direito de representar a classe dos advogados;
b) Lei n.º 4.717/65 que regula a ação popular prevendo a possibilidade de qualquer cidadão ajuizar ação em defesa do patrimônio público; e
c) Lei n.º 6.938/81que dispõe sobre a Política Nacional do meio ambiente.
Ainda no plano infraconstitucional, a Lei n.º 7.853/89 que dispõe sobre o apoio a pessoas portadoras de deficiência, a Lei n.º 7.913/89 que trata da ação civil pública por danos causados ao meio ambiente, a Lei n.º 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), a Lei n.º 9.394/96 que trata das Diretrizes Básicas da Educação, a Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), a Lei n.º 8.429/92 que trata dos atos de improbidade administrativa e a Lei n.º 10.741/03 (Estatuto do Idoso) também versam sobre tutela coletiva.
A Constituição Federal de 1988, na qual é evidente a preocupação com o princípio da efetividade da prestação jurisdicional, representou um grande avanço em termos de tutela coletiva, acelerando, sobremaneira, a mudança do paradigma até então predominante.
Isso porque a Constituição consagrou diversos direitos transindividuais, tais como o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225, “caput”), direito à defesa do consumidor (art. 170, inciso V), direito à preservação da continuidade e da unidade histórico-cultural do ambiente urbano (art. 18, §4º), entre outros.
E para defesa desses direitos, o constituinte consagrou expressamente a ação civil pública, estendendo-a para a defesa de outros direitos difusos e coletivos (art. 129, inciso III), revigorou a ação popular, possibilitando-lhe também a defesa de direitos de ordem difusa (art. 5º, inciso LXXIII) e criou o mandado de segurança coletivo (art. 5º, inciso LXIX.
Segundo Carlos Henrique Bezerra Leite, “sobreveio o Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078, de 11.9.90), cujo art. 110 acrescentou o inciso IV ao art. 1º, da Lei n. º 7.347/85, restabelecendo, assim, um dos efetivos previstos originariamente no anteprojeto da LACP: a proteção de “qualquer outro interesse difuso ou coletivo”.
Mesmo diante da perfeita sintonia entre o CDC (arts. 90 e 110) e a LACP (art. 21), mando ambos, sem nenhuma ressalva quanto aos órgãos jurisdicionais encarregados de conhecer e julgar a ação civil pública, um sistema integrado de proteção a quaisquer interesses metaindividuais, o certo é que, na prática, foi inexpressiva, durante esse período, utilização da ação civil pública na Justiça do Trabalho.
Somente a partir de 20 de maio de 1993, quando entrou em vigor a Lei Complementar n.º 75, de Lei Orgânica do Ministério Público da União LOMPU, é que a doutrina e a jurisprudência juslaboralistas, por força do seu art.83, inciso III2, passaram a admitir a ação civil pública trabalhista, mesmo assim com diversas restrições de ordem processual, tais como: competência funcional, que seria, a exemplo dos dissídios coletivos, originária dos tribunais; legitimátio ad causam do Ministério Público objeto central deste trabalho, que seria apenas para defender interesses coletivos stricto sensu etc.
Já para Thais Macedo Martins, “o Código de Defesa do Consumidor, cujo advento representou uma reestruturação da Lei nº 7.347/85 de tal forma que se faz necessária a análise conjunta dos dois diplomas normativos, utilizou a expressão ação coletiva”.
Para ela, “alguns autores defendem que essas duas expressões são sinônimas, enquanto outros defendem que a ação coletiva é gênero do qual a ação civil pública é espécie. Nesse grupo, existem dois critérios de classificação: o primeiro é o de que a ação coletiva se prestaria também para tutela de interesses individuais homogêneos, além de difusos e coletivos, ao passo que a ação civil pública teria seu objeto restrito à defesa dos dois últimos. O segundo é o de que a ação civil pública seria a espécie de ação coletiva ajuizada pelo Ministério Público”.
Conclui-se então que, através da ação civil pública é possível a defesa de direitos individuais homogêneos, como a ação através da qual é possível a tutela de direitos difusos, coletivos em sentido estrito e direitos individuais homogêneos. Fica evidente no art. 83 do CDC.
Concluo, mencionando que, na esfera legislativa, pode-se afirmar que o Brasil está entre os países mais avançados do mundo no que tange à defesa da tutela dos direitos coletivos, sobressaindo o fato de que o termo “direitos individuais homogêneos” foi criado em nosso ordenamento jurídico pelo Código de Defesa do Consumidor.
Ocorre que, no Brasil, não se verifica a utilização adequada dos instrumentos legalmente previstos para tutela dos interesses coletivos, como comprova o fato de que a maioria das ações coletivas é ajuizada pelo Ministério Público, o que sobrecarrega esse órgão e minimiza, em parte, o caráter participativo das ações coletivas, mais evidente quando o autor seja uma associação representativa de classe. É preciso, contudo, alterar a mentalidade da sociedade e dos operadores do direito, alertando para a relevância das ações coletivas.
Isso porque, infelizmente, em nosso país, verifica-se que muitos dos direitos consagrados na legislação infraconstitucional e na própria Constituição Federal não são implementados na prática, o que decorre, em grande parte, das dificuldades de implemento do direito de acesso à jurisdição.
NOTAS:
1 - Integraram a comissão que elaborou o anteprojeto de lei que resultou na LACP: Ada Pellegrini Grinover, Candido Rangel Dinamarco, Kazuo Watanabe e Waldemar Mariz de Oliveira Jr.Esse anteprojeto contou, ainda, com a colaboração de alguns membros do Ministério Público de São Paulo, como Edis Milare, Nelson Nery Junior e Antonio Augusto Mello de Camargo Ferraz. Nelson Nery Junior ressalta, contudo, quem primeiro escreveu no Brasil sobre a defesa dos interesses difusos em juízo foi o Prof. Waldemar Mariz de Oliveira Júnior (PUC_SP) (“Tutela jurisdicional dos interesses difusos”, in: Estudos sobre o Amanhã (Ano 2000), caderno 2, SP,_ 1978). (Código de processo civil comentado... cit. p.1.503, nota 1).
2 - Diz o art. 83, III, da LOMPU: “Art.83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho: (...) promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para a defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos.”
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1. LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação Civil Pública na perspectiva dos Direitos Humanos, 2ª edição, LTR, São Paulo: 2008, pág. 96 a 121. Material da 1ª aula da Disciplina Tutela Coletiva e Processo do Trabalho, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu Tele Virtual em Direito e Processo do Trabalho –UNIDERP/REDE LFG.
2. Martins, Thais Macedo. Tutela coletiva e estado democrático de direito. Relações com o direito do trabalho - Juíza do Trabalho Substituta do Tribunal Regional do Trabalho da 3º Região. Especialista em Processo.
3. Civil. Mestranda em Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
4. CARRION, Valenti, - 1931-2000 – Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho/Valentin Carrion. – 33. Ed. Atual. Por Eduardo Carrion. – São Paulo: Saraiva, 2008.
5. MACHADO, Costa. - CLT Interpretada. – Ed. Manole Ltda, Edição Brasileira 2007.
6. MARTINS, Sérgio Pinto. – Direito do Trabalho – 25º Edição – Editora Atlas 2009.
7. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1998
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